Membro
da Rede da Sociedade Civil para a Boa Governação (RESCBOGOV), Jorge do Carvalho
do Rio, integrou o intercâmbio a Moçambique e fala da experiência trazida e dos
desafios actuais em S.Tomé e Príncipe.
Sociedade Civil STP: Integrou a recente missão da RESCBOGOV a Moçambique. Que conhecimentos a Rede adquiriu com este intercâmbio? Quais as principais aprendizagens que trouxe consigo?
Sociedade Civil STP: Integrou a recente missão da RESCBOGOV a Moçambique. Que conhecimentos a Rede adquiriu com este intercâmbio? Quais as principais aprendizagens que trouxe consigo?
Jorge
do Rio: Fui em representação da ONG MARAPA como membro da rede. Em carteira nós
levávamos os seguintes objectivos: monitoria e advocacia de políticas públicas,
transparência e boa governação, aumento de capacidade de influência política da
sociedade civil santomense. Portanto, pretendíamos lá era ganhar experiência de
trabalho. Nós visitamos várias organizações em Moçambique, a destacar o CIP de
Moçambique que é uma organização bastante forte que nos deu muitos ensinamentos
e encorajamentos. Têm feito um trabalho excelente e promissor para a sociedade
moçambicana. Partilhamos com eles as dificuldades e boas práticas também, e
tivemos várias apropriações de trabalhos de organizações congéneres. Vamos
agora ver se trabalhamos essas habilidades com a nossa realidade. O CIP de
Moçambique faz monitoria das políticas públicas, do Orçamento [de Estado], e
faz advocacia. Portanto, são convidados pela Assembleia para acompanharem a
discussão dos Orçamentos. Para nós, essa é uma questão bastante relevante. Eles
conseguiram um ganho que é influenciar a legislação sobre a lei anti-corrupção.
Conseguiram fazer com que o Estado publicasse também os contratos com as
indústrias extractivas. Isto é um ganho bastante grande e nós em São Tomé e Príncipe
teremos que trabalhar nesse sentido para que possamos também participar nas
discussões dos orçamentos e na publicação de dados sobre recursos.
SCSTP:
Que diferenças há, em termos de trabalhos de advocacia, entre a sociedade
civil santomense e a moçambicana?
JR:
Nestes termos, a sociedade civil moçambicana está muito mais organizada e muito
mais avançada. Aliás, já tiveram momentos como o nosso, apostaram e hoje já
fazem muito trabalho de advocacia junto do governo e das instituições
internacionais. Com relação às organizações que lidam com crianças em
Moçambique, conseguiram que publicassem muitas leis que protejam as crianças.
Trabalham com o Ministério da Educação e Saúde, portanto, aplicam normas e têm
vários ganhos neste sentido. Há também organizações que trabalham muito com
senhoras, sobretudo na questão do cancro do útero e da mama. São organizações
que influenciam muito outras organizações congéneres e parceiros
internacionais, tanto que colaboram no sentido de fazerem os testes. Assim, a sociedade
tem apoios na prevenção e no tratamento do cancro. O governo acata as
contribuições dessas organizações. Os trabalhos dessas organizações são
comunicados ao CIP de Moçambique e este depois faz a sua monitorização junto do
Estado.
SCSTP:
Na sua opinião, quais as mais valias deste tipo de iniciativas para o
trabalho levado a cabo pela sociedade civil santomense?
JR:
Essas trocas de experiência são muito importantes. Só que até ao momento, nós
fizemos intercâmbios com dois países com economias muito distintas da nossa.
Angola é um país com uma economia muito forte, com muitos recursos naturais e
com um regime não muito idêntico ao nosso. Moçambique não é muito diferente.
Nós, infelizmente, temos poucos recursos. O nosso Orçamento de Estado é quase
90% proveniente das ajudas externas. Em Angola e Moçambique essas ajudas são
muito menos. Portanto, são realidades muito distintas, mas entretanto no caso
de Moçambique há ganhos grandes em relação a isso. O Estado já publica os dados
relativos às receitas provenientes da extracção dos recursos petrolíferos. O
próximo intercâmbio talvez fosse feito para um país com menos recursos. Eu
talvez propunha um país pobre como São Tomé e Príncipe que depende muito do
exterior. Podíamos, talvez, fazer algumas comparações mais realistas. É sempre
importante essas trocas de experiência, porque nós vamos ver como os outros
estão a trabalhar, quais são as suas dificuldades e os ganhos. Este é um
trabalho árduo, complicado e melindroso que vai mexer com as pessoas que não
querem que sejam mexidas. São questões muito melindrosas que estão em jogo.
Mesmo em Moçambique, os colegas chamaram-nos a atenção de que o trabalho da
monitoria às contas públicas é um trabalho muito delicado e apelaram-nos para
quando tivermos que fazer algum trabalho ou publicação, que fosse feita de uma
forma mais evidente e clara possível, e que no documento não haja nada
falsificado. Muitas vezes, as pessoas que estão a ser monitoradas, ao apanharem
um pequeno erro da parte da organização, todo o trabalho pode cair por água
abaixo.
SCSTP: Que desafios a Rede poderá enfrentar no trabalho de monitoria e
advocacia em São Tomé e Príncipe?
JR: Em São Tomé, as
coisas do Estado são, muitas vezes, mal aplicadas e orientadas. Há uma
necessidade de todos nós dedicarmos a estas questões. Temos muitos casos. Ainda
nos últimos dias, acompanhávamos na televisão um programa que revelava que
muitas obras do Estado são muito mal realizadas e pondo em risco a vida das
pessoas. Temos o caso do Mercado de Côcô-Côcô, por exemplo, que é uma obra
recente e de uma certa envergadura mas muito mal finalizada. Se nós compararmos
com o Mercado Municipal que foi construído na era colonial, com cerca de 40
anos, está em melhor estado em termos de estrutura física. E outras obras mais.
Mesmo ao nível dos ministérios, vemos que há um desligamento na estrutura do
Estado. Hoje vamos ver pouca gente a querer uma engenharia em agronomia ou
pesca, porque os mais jovens estão a crescer e estão a ver que as áreas mais
promissoras no país são áreas desses ministérios que têm muito mais
facilidades. O estado deve ter em conta que o país só vai crescer se nós
tivermos uma engenharia muito bem aplicada. Se formarmos muitos economistas e
juristas não teremos espaços.
Nós [Rede] sabemos
que vamos encontrar vamos constrangimentos. Aqui ninguém quer ser tocado. Mas é
verdade que temos que influenciar o próprio Estado para que nos prestem
informações. Muitas vezes, algumas pessoas podem achar que são trabalhos que
lhes podem prejudicar, mas no âmbito geral da Nação, são trabalhos que vêm ser
mais esclarecedores para o desenvolvimento da própria sociedade.
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