Presidente do Centro de Integridade Pública de São Tomé e Príncipe e membro da Rede da Sociedade Civil para a Boa Governação (RESCBOGOV), Deodato Capela compara a sociedade civil santomense e a moçambicana e fala-nos dos desafios da Rede em S.Tomé e Príncipe.
Sociedade Civil STP: Integrou a recente missão da
RESCBOGOV a Moçambique. Que conhecimentos a Rede adquiriu com este intercâmbio?
Quais as principais aprendizagens que trouxe consigo?
Deodato Capela: No início da formação
da Rede, eu tinha alguma dúvida quanto às boas práticas que esta rede poderia
implementar em STP. Com a ida a Moçambique, eu fiquei mais convencido que essas
práticas podiam ser exequíveis no nosso país, concretamente na aplicação da
monitoria e da advocacia da rede da sociedade civil, portanto, no que concerne
à boa governação. Em Moçambique, a experiência com as instituições que
visitamos foi muito esclarecedora, tanto nos desafios das organizações que têm
já bastante experiência na monitoria e advocacia. Não ficamos só na boa
governação e transparência, também tivemos contacto com organizações que fazem
parte do Fórum, uma plataforma bastante avançada em termos de mobilização da
sociedade civil.
A principal aprendizagem foi, inicialmente, na técnica da interacção
com o Governo e em recolha de subsídios ao nível de várias organizações que
fazem parte do Fórum. Eles têm vários fóruns, inclusive têm um grupo alargado.
Era uma espécie de rede que agora tem menos acção, mas em termos de acção ou
direito de cada grupo notou-se que eles têm uma dinâmica bastante forte e esta
é uma experiência que nós podemos tentar implementar em STP, portanto, com a
nossa Rede que se está a iniciar agora. No que concerne à interacção com o
Governo, o Governo Central (em Moçambique) tem atenção em chamar as
organizações da sociedade civil para discutir ao nível anual ou temático vários
assuntos que nós em STP não somos reconhecidos neste aspecto. E noutro aspecto
que é bastante importante é o financiamento. A condição sine qua non para que a
sociedade civil tenha sustentabilidade é preciso ter dinheiro. E financiamento
nesse aspecto não é problema para as organizações da sociedade civil em
moçambique porque há muitos apoios ao nível dos países nórdicos, ao nível de organizações
internacionais que estão a apoiar essas organizações. Uma das aprendizagens que
nós trouxemos é como recorrer a esses financiamentos com a visibilidade dos
nossos trabalhos.
SCSTP: Que diferenças há, em termos de trabalhos
de advocacia, entre a sociedade civil santomense e a moçambicana?
DC: Há muita diferença. Nos podemos
dizer que estamos na fase inicial no que concerne à advocacia. Nós em STP
estamos a tentar dar os primeiros passos, enquanto que em Moçambique já dão
passos gigantes. Têm muitas instituições que advogam desde a igualdade do
género, organização das mulheres que trabalham na lei de igualdade das mulheres
na Assembleia. Dai, vamos ver que se envolver as mulheres na Assembleia elas
têm capacidade de legislar para apoiar interesses da mulher. Este é um aspecto
que as organizações em Moçambique, no que concerne a questões de género
feminino, estão muito preparadas que elas próprias criam lobby directamente na Assembleia. Quando se fala em pessoas, elas
recorrem directamente às senhoras que estão na Assembleia para advogar a nível
de interesses da mulher nas organizações da sociedade civil. Este é um dos
aspectos que se vê em Moçambique e que nós em STP ainda não estamos nesse
patamar.
A nível da saúde há muitas organizações que têm, ao nível da Assembleia,
activistas que trabalham em organizações e são eles que apresentam a proposta
tanto da sua bancada como a nível do governo. É uma parte que ainda nos falta.
O nosso dobramento jurídico em STP não tem muitas manobras da qual a sociedade
civil pode advogar no que concerne aos interesses das organizações da sociedade
civil. Nós temos uma lei da petição, mas em termos legista é só governo que
pode fazer os decretos e a Assembleia que pode criar as leis. Existe uma lei
mas não é uma prática corrente da qual a sociedade civil pode advogar na Assembleia
para salvaguardar seus interesses. Nos podíamos usar o método de Moçambique que
são as pessoas, os deputados ou membro do governo que tenha interesse em
matéria das organizações para pressionar para salvaguardar o interesse.
SCSTP: Na sua opinião, quais as mais-valias deste
tipo de iniciativas para o trabalho levado a cabo pela sociedade civil
santomense?
DC: Hoje em dia, é bom que se possa haver intercâmbios nessa
fase inicial e conhecer outras realidades. A mais-valia que se pode tirar desse
tipo de iniciativa é que nós somos um pais insular, temos as nossas
características próprias. Nós sabemos que a nossa realidade socio-política e
económica é distinta daqueles países onde fazemos intercâmbios. Nós ficamos com
inveja como é que em Moçambique têm tantos doadores que nós em STP não temos.
Portanto, a realidade em STP é bastante distinta. Por exemplo angola é uma
realidade bastante diferente. Um país que saiu da guerra, que tem uma vida
social e política diferente da nossa. Nos temos muito mais acesso a vários documentos
e pessoas mais do que em Angola que tem um sistema de governo que pode ser
aberto a democracia mas que tem alguma dificuldade em interacção com organizações
da sociedade civil.
Nós aqui somos bastante avançados no que concerne a
liberdade de expressão, a liberdade de acesso a algumas informações. Mas o que
se pode assegurar é que para ter uma mais-valia tinha que ser a vivência da
experiência. Portanto, no caso de Moçambique tem uma experiência bastante
avançada e o bom é conhecer essas experiências para não cometer, nessa fase
inicial, mesmos erros que alguns deles podiam cometer. Dai a credibilidade que,
por exemplo, o CIP de Moçambique tem é uma mais-valia que podemos trazer pra
nós com esse intercâmbio e tentar basear nessa mais-valia desde início e não
fazer nada mal. Por exemplo, uma organização quando começa a produzir um
relatório, se comete alguma gralha logo no princípio, perde logo credibilidade.
Eles próprios disseram que já tiveram alguns dissabores. As organizações da
sociedade civil podem ser atacadas quando se faz algo de mal, seja criminal ou
se viermos a produzir qualquer documento ou reportagem que não corresponda a
realidade, incorre ao próprio processo de difamação. E nesse aspecto, há que
ter muito cuidado para a credibilização da organização, para que não cometa
alguns erros. O projecto vai incidir na investigação e divulgação. Por falta do
acesso a algumas informações pode-se cometer algumas falhas por não ter
condições reais de aceder a esses documentos. Ou a pessoa que dá informação não
dá correctamente e nós levamos por boa-fé e cometemos um erro. Isto faz com que
nos caiam em cima. E isto é um aspecto a evitar. Só divulgar quando estamos
perante factos e documentos credíveis, dados factuais.
SCSTP: Que desafios a Rede poderá enfrentar no trabalho de monitoria e
advocacia em São Tomé e Príncipe?
DC: Os desafios são enormes, por haver
algumas lacunas legais no nosso país. Num dos casos é o acesso a informação. A
lei da criminalização dos titulares de cargos políticos é um desafio que nós
podemos trabalhar na sua advocacia. Em termos de direitos humanos, nos sabemos
que em termos de sensibilização dos nossos políticos para a importância desta Rede
para que eles assumam o grau da importância desta Rede. Um dos desafios
importantes que esta Rede tem que fazer é mostrar aos decisores que esta rede é
importante em STP para o desenvolvimento social, político e económico do povo.
Essa Rede não vem para atacar ninguém, não vem para dificultar a vida de ninguém.
Mas sim, com o objectivo de desenvolver STP. Sendo assim, todos assumirão e a
própria Rede terá a vida mais facilitada, teremos acesso às pessoas e os
próprios jornalistas, em vez de sermos nós a pedir entrevista, eles é que vêm
ter connosco porque sabem que nós temos importância e conhecerão a importância
deste projecto.
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