AVISO: Este documento foi preparado
pelos participantes na formação em jornalismo de investigação em São Tomé e
Príncipe, nos dias 15 a 17 de Janeiro de 2019, no âmbito do projecto Sociedade
civil pelo Desenvolvimento: Mais Transparência, Melhor Governação. A responsabilidade pelas
informações e opiniões expressas neste exercício recai inteiramente sobre os
seus autores. A FONG-STP, a ACEP e os financiadores não podem ser responsabilizados
pela utilização que possa ser feita das informações nele contidas.
A RIDUX do empresário angolano Mello Xavier ou a SOLNIVAN dos irmãos Monteiro de São Tomé e Príncipe – quem vai assumir o comando da ROSEMA? O Tribunal de Lembá decidirá em breve qual o destino a dar à empresa cuja propriedade mudou mais de três vezes ao longo de duas décadas. Um conflito judicial de mais de dez anos entre duas sociedades angolanas, a RIDUX e a JAAR, está na origem do actual impasse. A entrada em cena dos irmãos Domingos e António Monteiro suscitou a contestação do proprietário angolano. Houve novas acções em diferentes tribunais, cujas decisões, por vezes opostas, prolongaram o impasse e a incerteza sobre o futuro de uma empresa que representa uma das maiores fontes de riqueza para o país, geradora de receita e de emprego. Para trás, fica uma teia de interesses, conflitos e suspeitas de corrupção que só em parte é possível desvendar.
1 – Como foi criada a ROSEMA?
Foi criada como empresa pública com o nome Ceto após a independência, e nessa altura era uma fábrica que produzia cerveja, vinho e refrigerantes. Os primeiros equipamentos foram instalados no quadro da cooperação entre São Tomé e Príncipe e a ex-República Democrática Alemã (RDA).
2 – Quando foi vendida?
Foi vendida nos anos 90 para a sociedade Cervejeira ROSEMA, que tinha como accionista maioritário a RIDUX sociedade do empresário angolano Mello Xavier. O negócio formalizou-se mediante um concurso público internacional promovido pelo Governo santomense com a assessoria do Banco Mundial.
3 – Empresas de que países participaram no concurso?
Além da empresa RIDUX de Angola e dos empresários santomenses, também a portuguesa SuperBock participou no concurso. De acordo com o ex-director do Fundo Nacional de Privatização, Zeferino Ceita, a RIDUX venceu o concurso ao apresentar a proposta de 1,2 milhões de dólares, valor pelo qual adquiriu a fábrica.
4 – Qual a importância da Cervejeira ROSEMA para o País?
Esta empresa é estratégica do ponto de vista económico, financeiro e social, porque para além da sua receita financeira emprega centenas de santomenses. Já exportou cerveja para a vizinha Angola, com a marca Criola. Actualmente desconhece-se o volume da sua produção.
5 – Quem são os accionistas da Cervejeira ROSEMA?
Além da RIDUX Lda, eram accionistas minoritários santomenses a sociedade ARGENTIMOA e os sócios Cruz, Lázaro e Manuel Salvador. Em 2009, no âmbito de um processo de execução juridicamente controverso no Tribunal de Lembá, a empresa fica entregue à sociedade de direito angolano JAAR Comércio Geral Prestação de Serviço Agro Pecuária LDA. Enquanto decorria o processo de penhora no Tribunal Marítimo de Luanda, o fiel depositário – o empresário santomense António Monteiro – assumiu o controlo da fábrica. Mais tarde, a empresa dos irmãos Monteiro, a SOLNIVAN, torna-se proprietária, através de uma alegada compra à JAAR que não está clarificada.
6 – O porquê da polémica?
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) decidiu em 2018 anular todos os actos passados e devolver a fábrica ao empresário Mello Xavier. Contudo, a decisão ficou suspensa até à presente data porque o Tribunal de Lembá não acatou a decisão do STJ, dando razão à providência cautelar apresentada pela SOLNIVAN.
7 – Quantas vezes mudou de proprietário desde a privatização?
Sete vezes. Na década de 90 era propriedade da Cervejeira ROSEMA. Em 2009, passou para a JAAR que depois a vendeu à SOLNIVAN em 2012. Por decisão do tribunal em 2014, por um breve período, a fábrica retorna à Cervejeira ROSEMA mas no mesmo ano passa para as mãos da SOLNIVAN. Em 2018, o Supremo Tribunal de Justiça decide devolver a fábrica à Cervejeira ROSEMA, não tendo ainda sido executada a decisão por via da providência cautelar apresentada pela SOLNIVAN.
8 – Quando e como passou para as mãos dos irmãos Monteiro?
Muito antes do impasse judicial actual em São Tomé e Príncipe, originado pela decisão do STJ, houve um conflito jurídico entre as empresas RIDUX e JAAR, ambas de direito angolano. Este conflito levou à penhora das acções da Cervejeira Rosema de que a RIDUX era sócia maioritária pelo Tribunal de Lembá. Durante este período foi nomeado como administrador provisório e fiel depositário da JAAR António Monteiro, além de dois auxiliares. A justiça angolana pedia apenas a efectivação da penhora das acções da RIDUX. Porém, o Tribunal de Lembá executou a penhora resultando na entrega da fábrica à JAAR. Ao fazê-lo, não teve em conta os interesses dos accionistas minoritários santomenses na Cervejeira ROSEMA. A penhora foi depois anulada em 2014 e comunicada ao Supremo Tribunal de Justiça pelo Tribunal Marítimo de Angola onde decorreu o processo entre as empresas angolanas RIDUX e JAAR.
9 – Que interesses têm os partidos na ROSEMA?
Os principais partidos santomenses têm grandes interesses uma vez que a ROSEMA representa uma das maiores fontes de receitas para os cofres do Estado, bem como uma possível fonte de financiamento partidário.
Por sua vez, Mello Xavier é um político e um empresário influente em Angola, com ligações ao MPLA.
10 – Existem suspeitas de corrupção?
As suspeitas de corrupção de pagamento ao juiz do processo no Tribunal de Lembá surgem em diferentes momentos. Há alguns anos, o antigo juiz que estava no processo do Tribunal Distrital de Lembá afirmou ter recebido um suborno para alterar a decisão da entrega da fábrica aos irmãos Monteiro. Já em 2018, num outro desenvolvimento, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Silva Cravid, afirmou à comunicação social ter sido objecto de uma tentativa de suborno com envelopes contendo uma soma total a rondar os 200 mil euros.
11 – Os proprietários cumprem as obrigações fiscais?
A dívida ao Estado da cervejeira ROSEMA atingiu cerca de seis milhões de euros. A informação foi relatada por Olinto Costa, director-geral dos Impostos à rádio Voz da Alemanha (DW). Olinto Costa referiu que nem a Cervejeira ROSEMA nem a SOLNIVAN cumpriam na totalidade o pagamento de impostos e outras obrigações ao Estado. O montante foi parcialmente amortizado pela SOLNIVAN, segundo a mesma fonte que não indicou o valor.
12 – Quem é afinal o verdadeiro proprietário?
No âmbito do conflito em curso aguardam-se as decisões do Tribunal Constitucional e do Tribunal Distrital de Lembá. Porém, antes desta novela, a Cervejeira ROSEMA tinha como accionista maioritário a RIDUX – uma das empresas do grupo Mello Xavier, que venceu o concurso público internacional promovido pelo Banco Mundial, no âmbito de privatização da referida fábrica na década de 90.
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