Pesquisador nacional do Índice do Orçamento Aberto 2017 e representante da ONG WeBeto, Waldyner Boa Morte, fala sobre a evolução de São Tomé e Príncipe no ranking do Índice do Orçamento Aberto. Compara o nosso país com os outros no que concerne à matéria da transparência orçamental e explica como é que o país pode melhorar a transparência orçamental para assim atingir melhor posição nesse ranking internacional.
Sociedade Civil STP: Em que consistiu este estudo de transparência orçamental?
Waldyner Boa Morte: Trata-se de um trabalho de pesquisa feito a nível mundial onde o nosso país também está incluído. Esse estudo mede até que ponto os Estados são transparentes relativamente a matéria do orçamento. É recorrido a 109 indicadores que ajudam a compreender a transparência dos Estados em relação aos orçamentos.
SCSTP: Qual tem sido a evolução de São Tomé e Príncipe neste ranking?
WBM: Se recuarmos no tempo, há dez anos, a primeira vez que o nosso país foi submetido a essa avaliação, tivemos zero como nota nesse ranking. Ao longo do tempo, houve melhorias. Em 2010, tivemos 17, em 2016, conseguimos uma classificação de 29, em 2018 conseguimos 31. Significa que houve melhoria no que concerne ao acesso a informação orçamental. Entre os vários indicadores, a disponibilização pública de documentos para esta avaliação, como o OGE, ele está disponível online no site das Finanças, e todos podem ter acesso. Isso é bom. É para nós olharmos como é que uma simples disponibilização pública de informações contribui para que o país caminhe a uma classificação que ainda é inferior à média global, mas que tem tido evolução. Se nós olharmos para este estudo, sobretudo olhando para aquilo que é o índice para a transparência no processo do Orçamento Aberto, há um factor muito importante que tem a ver com a participação pública. É a maneira como o cidadão participa no processo orçamental. A verdade é que nós assistimos, muitas das vezes, os sucessivos Governos planificam as coisas para as comunidades, muitas das vezes, sem ouvir as Associações dessas comunidades para que elas participem também. Olhando para este relatório, há algumas recomendações, independentemente dos Governos continuarem a divulgar e permitir mais acesso à informação, pedem também que haja envolvimento da sociedade civil sobretudo na etapa da planificação.
SCSTP: STP tem evoluído nesse ranking. De que forma é que se pode comparar o nosso país com os outros?
WBM: Comparando a nossa classificação com a de outros países, nesta altura, é preciso sublinhar que os mesmos critérios utilizados para avaliar a transparência em São Tomé e Príncipe são utilizados para avaliar a transparência nos Estados Unidos, Portugal, Alemanha, etc. Portanto, todos os países são avaliados de acordo com os 109 indicadores previamente definidos. Mas, se olharmos para a classificação dos países africanos, vemos alguns bons exemplos. Na África lusófona, nós conseguimos dar alguns passos. Mas se olharmos para a classificação global, vemos países como a Dinamarca, a Noruega, etc, onde a transparência é alta e cada cidadão sabe onde é que que vai o dinheiro público. Nesses países, os cidadãos sabem como é que os governos gastam aquilo que é do povo. Há uma planificação também em função daquilo que é o engajamento quer do Poder Local, quer das Associações. Portanto, em termos de transparência, esses países têm uma excelente classificação. Há um conjunto de recomendações que o relatório faz e se o nosso país segui-las, nos próximos estudos, poderá melhorar a sua pontuação. Esse estudo foi entregue ao governo e este mostrou engajamento no cumprimento de algumas orientações deixadas pelo estudo.
SCSTP: Como é que STP pode melhorar a transparência?
WBM: Temos que encontrar a disponibilidade pública dos documentos como o OGE, o relatório de execução orçamental, o relatório de contas, o envolvimento da sociedade civil no momento da planificação, etc. É um conjunto de medidas que se forem seguidas, o nosso país poderá ver melhorada a sua classificação para a média global que ambicionamos chegar, que é uma classificação de 42. Será um sinal de que o país está engajado a afirmar-se como um Estado transparente em matéria orçamental. STP deverá publicar um relatório anual online, produzir o orçamento cidadão, uma declaração pré-orçamental, uma revisão semestral, os atrasos na produção de relatórios de auditoria devem ser reduzidos, alargar as informações sobre as políticas do executivo, etc.
SCSTP: Em que medida o poder legislativo oferece fiscalização orçamental?
WBM: O principal papel dos deputados é o de fiscalizar a governação. Sabemos que existem deputados do poder e da oposição que devem executar esse papel consagrado no Estatuto do Deputados. Acreditamos que o papel da Assembleia Nacional é fundamental no processo de fiscalização.
SCSTP: De que forma a nossa participação pública se pode comparar com a de outros países?
WBM: As organizações da sociedade civil, sobretudo aquelas organizações do poder local, têm um papel determinante para o sucesso do desenvolvimento quer da comunidade, da região e do próprio país. Mas, temos consciência de que as organizações de base local não têm exercido realmente o seu papel. Há pouca aceitação do papel da sociedade civil no processo do desenvolvimento, mas as organizações locais podem dar um grande contributo na construção do bem comum local. A nível do planeamento, se se quer construir um mercado ou uma escola sem consultar essas organizações sobre as suas prioridades, podemos estar a gastar o dinheiro público e instalar uma infra-estrutura que não é útil, porque não fizemos o trabalho de auscultar a comunidade para saber se isso corresponde ao seu interesse. O Governo pode ter a melhor intenção em levar uma infra-estrutura, mas, afinal de contas, a prioridade da comunidade ser outra. No fundo, consultar previamente a comunidade e disponibilizar o que ela realmente quer.
SCSTP: Recentemente, o Governo praticou o Orçamento Participativo. Isso vai de encontro às recomendações?
WBM: Esse estudo de que agora estamos a falar recomenda que seja retomada essa prática de orçamento participativo. É um exercício que o Governo faz para recolher subsídios que são a contribuição das comunidades relativamente aos problemas e desafios que enfrentam. Essa prática ajuda o Governo a identificar os reais interesses das populações e serve como orientação para fazer uma planificação mais eficaz.
SCSTP: Como é que a WeBeto entra neste estudo?
WBM: A IBP, a organização internacional promotora deste estudo, trabalha com as organizações da sociedade civil à escala mundial. Sobretudo com ONG que estão viradas para as questões do orçamento e a transparência. Nos últimos anos, tem sido a WeBeto a parceira nacional da IBP. É uma pesquisa ao longo de 12 meses. O relatório que saiu em Janeiro deste ano é fruto de trabalho começado em Março de 2017 com o lançamento de inquéritos. O processo tem fases. A IBP contrata uma organização para lançar os inquéritos, mas depois contrata um revisor independente que vai fazer uma revisão daquilo que foi feito. Neste caso, foi contratado um revisor independente que analisou o relatório antes de ser divulgado. O processo passou por essas etapas. O Governo também se pronunciou sobre o relatório antes de ser tornado público. Essa nossa classificação é real. A IBP chama atenção para os atrasos dos relatórios de auditoria. Os relatórios são produzidos no momento oportuno. Esses relatórios são importantes porque servem de suporte para a nossa avaliação.
SCSTP: Mesmo não atingindo a media global que é de 42, ainda assim estamos em melhor posição que muitos outros países…
WBM: É preciso fazer mais e melhor. É possível chegar a 50 ou 60. Há ganhos que já se conseguiram. Hoje, qualquer cidadão, onde estiver, tem acesso a alguns documentos sobre o orçamento no site do Ministério das Finanças. É um critério que a IBP leva muito em conta: disponibilidade pública dos documentos. Não basta apenas produzi-los, é preciso publicá-los. Há países onde não disponibilizam documentos. Temos alguns ganhos. Portanto, acredito que o país pode melhor muito.
SCSTP: Em que medida diferentes instituições públicas oferecem a participação pública?
WBM: Participação pública em STP não é fácil. Ausência de uma lei de acesso à informação é hoje uma enorme barreira para a obtenção de informação. Uma pessoa que precisa fazer um trabalho de pesquisa que requer ter acesso aos documentos públicos, é complicado o acesso. Muitas vezes, consegue-se informações porque se tem, na instituição, familiares ou amigos que queiram ajudar. Isso não possibilita muita participação das pessoas.
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